sábado, 9 de outubro de 2010

Assim surgiu Minas...




A Guerra dos Emboabas foi um confronto travado de 1707 a 1709, pelo direito de exploração das recém-descobertas jazidas de ouro, na região das Minas Gerais, no Brasil. O conflito contrapôs, de um lado, os desbravadores vicentinos, grupo formado pelos bandeirantes paulistas, que haviam descoberto a região das minas e que por esta razão reclamavam a exclusividade de explorá-las; e de outro lado um grupo heterogêneo composto de portugueses e imigrantes das demais partes do Brasil, sobretudo da Bahia, liderados por Manuel Nunes Viana – pejorativamente apelidados de “emboabas” pelos vicentinos –, todos atraídos à região pela febre do ouro.
Em novembro de 1708 Cachoeira do Campo, distrito de Ouro Preto, foi um dos palcos do sangrento conflito envolvendo os direitos de exploração de ouro na futura Capitania de Minas Gerais.
Este episódio não foi todo esclarecido ainda, sendo que há várias passagens obscuras.


Significado de Emboabas

Logo que a descoberta do ouro se espalhou, milhares de pessoas imigraram para a região, ficando pejorativamente conhecidos como "emboabas". O significado exato dessa palavra indígena, provavelmente tupi, é controversa.
Para algumas fontes, referia-se ao fato de que os imigrantes protegerem as pernas e os pés com botas e rolos de panos, ficando parecidos com aves designadas por tal nome.
Outros referenciam como galinhas calçudas.
Segundo o Dicionário Houaiss, emboaba seria a junção das palavras tupis mbo ("fazer que") + aba ("ferir"), sendo que mbo'aba seria um epíteto coletivo, aplicado a um grupo, e não apenas a um indivíduo. Assim, "os que invadem, agridem".


Causas da Guerra

A corrida pelo ouro atraiu para a região cerca de 50 mil pessoas "que fervilhavam à beira dos rios e caminhos, nos sertões distantes e inóspitos".
Os bandeirantes se denominaram com maiores direitos sobre o ouro das minas, seja por eles serem os descobridores do lugar, ou seja, pelo fato daquela região fazer parte da capitania de São Vicente, assim como pelas sucessivas rejeições da Coroa e reveses em Palmares. Prova disso foi petição da Câmara de São Paulo, de 7 de Abril de 1700, que requereu que a outorga do território aurífero fosse exclusivamente pelas autoridades desta capitania. Teve papel no conflito o protetor de Manuel Nunes Viana, Pascoal da Silva Guimarães.
Enquanto isso, os colonos da Bahia e de Pernambuco estavam muito mais ligados aos portugueses que aos paulistas. Os nomes que trocaram entre si mostravam suas diferenças. Os da terra eram chamados de "nômades", ou "bandoleiros sem lei", apelidaram os estrangeiros de emboabas, incluindo os vindos de outras capitanias. Os baianos e pernambucanos e os outros considerados estrangeiros ficaram do lado dos portugueses.
Para os paulistas, aqueles que não participaram dos esforços na procura de ouro não deveriam ter os mesmos direitos na exploração. A tensão entre os paulistas (também chamados de vicentinos) e os demais exploradores crescia, motivada pelo aumento no fluxo populacional e pela insistência dos paulistas e emboabas de controlarem a região.
Apesar de se misturarem pelas regiões povoadas das minas, paulistas e emboabas não se uniam, ao contrário, se juntavam cada grupo com um representante. O ex-bandeirante Manuel de Borba Gato era o líder dos paulistas, enquanto os emboabas eram liderados por Manuel Nunes Viana, português que veio para Bahia jovem, e era conhecido por atos de coragem que o trouxeram para a região onde era proprietário de lucrativas minas.
Outra causa da guerra seria o alto preço dos mantimentos, inclusive pela limitada oferta em ocasião do aumento da demanda.


O Conflito entre Emboabas e Vicentinos

Datam de 1706 as primeiras dissensões no arraial da Ponta do Morro, depois do Rio das Mortes, pela "morte injusta e tirânica que fez um paulista de um humilde forasteiro que vivia de uma pobre agência". Outro cronista diz por haverem alguns índios carijós embriagados matado um português. Diogo de Vasconcelos, por sua vez, descreve: "Viajando por ali uns carijós para São Paulo, entraram a beber na venda de um novato reinol; rivalidade era tema assentado de todas as conversas; os carijós começam a falar de reinóis, defendidos pelo novato, pouco experiente, entre a bebiba, houve altercação, e no ardor da discussão, foi morto o português pelos carijós. Fugiram estes, e houve dois dias de batida para os descobrir - voltaram os do arraial, os moradores tinham-se reunido e determinado enviar ao Rio uma comissão de procuradores pedir a D. Fernando Martins Mascarenhas Lencastre compadecer-se da situação e lhes mandar autoridade para reprimir malfeitores e bandidos."
Em 1707, no Arraial Novo do Rio das Mortes, dois chefes importantes dos paulistas foram linchados pelos emboabas. Com medo de uma vingança, fugiram para a mata, ficando apenas um pequeno grupo na resistência. Os paulistas, apesar de terem motivos para agir, limitaram-se a enterrar seus chefes, e não enfrentaram os emboabas. Isso encorajou os emboabas que haviam fugido para a mata a voltar e a não mais se aterrorizarem com os paulistas.
Não se deve pensar, segundo os historiadores, que estava em jogo apenas o ouro: «Intervieram também criadores de gado e não apenas mineradores emigrados de São Vicente. Os criadores reagiram ao sistema de contratos com o objetivo de assegurar, com exclusividade, o fornecimento a açougues de animais para o abate e de arbitrar a venda da carne ao consumidor.
Em 1708, um choque inevitável aconteceu, e os dois lados voltaram a guerrear. Manuel de Borba Gato interveio, banindo Nunes Viana da região do Rio das Velhas, porém, sem sucesso. Várias tentativas de acordo foram feitas, todas infrutíferas. Os emboabas tomaram a iniciativa de desarmar todos os paulistas que encontravam, com o pensamento que estes preparavam um grande ataque contra eles. Houve pouca resistência, e ao fim de 1708 os emboabas já tinham o controle de duas das três áreas de mineração mais importantes. Os paulistas refugiaram-se na região de Rio das Mortes.
Os emboabas reuniram-se e proclamaram Nunes Viana governador da região mineradora, um afronta ao rei o único a ter a prerrogativa para a escolha. Em seguida, os emboabas encarregaram Bento do Amaral Coutinho da expulsão dos paulistas restantes. Os paulistas não opuseram resistência, e recuaram mais uma vez, desta vez para Parati e São Paulo.



Capão de Traição

O mais trágico e emblemático episódio da Guerra dos Emboabas ficou perpetuado na história como Capão da Traição. Após a derrota dos paulistas na batalha campal de Cachoeira do Campo, estes se renderam e foram anistiados com a pena de se retirarem da região das minas. Vários paulistas pararam em um capão na região situada próxima aos Arraiais da Ponta do Morro (próximo à atual Tiradentes) e Novo de Nossa Senhora do Pilar (atual São João del-Rei), provavelmente na região da antiga Fazenda do Córrego. Talvez tivessem os paulistas a intenção de reorganizar a sua tropa e marchar novamente contra os Emboabas, agora em guerra de cerco, ou guerra de tocaia.
O exército "Emboaba" encontrava-se também nas imediações. Os paulistas enviaram então alguns índios cativos para averiguar a posição dos Emboabas e atraí-los para uma emboscada no capão. A estratégia funcionou e o exército dos Emboabas marchou em direção da armadilha paulista, sendo recebido a tiros e muitos de seus caindo vitimados de disparos vindo de cima do arvoredo.
Mas houve o contra-ataque por parte dos emboabas comandados por Bento do Amaral Coutinho. Após ver tombar seu negro de confiança, Bento reorganizou seu exército em linha e marchando para traz todo o destacamento Emboaba ficou fora da alça de mira dos paulistas. Estes por sua vez viram-se cercados e resistiram bravamente por dois dias, até solicitarem a trégua e a rendição a Bento do Amaral. Este chefe Emboaba chegou a jurar pela Santíssima Trindade que após a rendição e deposição das armas dos paulistas, não os mataria e expediria livre conduto para estes seguirem para fora da região das minas.
Mas, após a rendição e entrega das armas, Bento decretou o massacre de todos os cerca de 300 paulistas capturados. Agindo como um traidor, e perpetuando a derrota final aos paulistas no Capão da Traição.
Derrota dos paulistas
O confronto terminou por volta de 1709, graças à intervenção do governador do Rio de Janeiro, Antônio de Albuquerque Coelho de Carvalho, que destituiu Nunes Viana e manteve a estrutura administrativa emboaba. Sem os privilégios desejados e sem forças para guerrear, os paulistas retiraram-se da região. Sua última tentativa de expedição punitiva contra os emboabas foi derrotada no Rio das Mortes. Muitos deles foram para o oeste, onde mais tarde descobriram novas jazidas de ouro, na região dos atuais estados do Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás.


Consequências

          Regulamentação da distribuição de lavras entre emboabas e paulistas.
          Regulamentação da cobrança do quinto.
           Cisão da Capitania de São Vicente em Capitania de São Paulo e Minas de Ouro e Capitania do Rio de Janeiro, ligadas diretamente à Coroa em (3 de Novembro de 1709).
          São Paulo deixa de ser vila tornando-se cidade
           Acabam as guerras na região das minas, com a metrópole assumindo o controle administrativo da região.
           A derrota dos paulistas fez com que alguns deles fossem para o oeste onde, anos mais tarde, descobririam novas jazidas de ouro nos atuais estados do Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Mineiridade



Sempre imaginamos mineiros com um fogão de lenha aceso e uma mesa simples ou até sofisticada de café com biscoitos, broas de fubá, pão de queijo; nossos pensamentos, quando se trata de descrever mineiros, quase sempre viajam à mineirice de seus "uais". Sequer aprofundamos na origem deste UAI que, na verdade, teve início na Mina de Morro Velho, em Nova Lima, quando os ingleses a arrendaram por um período de cem anos e ali faziam sempre a pergunta em inglês: WHY? É que WHY, como todos sabem, significa a pergunta POR QUE, mas que os mineiros entendiam UAI e começaram a usá-la aleatoriamente, a seu bel-prazer. E, então, ao contrário do que os não mineiros imaginam, falar UAI é chiquérrimo. É um galicismo (palavra importada do inglês)!!!

Aquelas fazendas de casas coloniais, aqueles casarões com mesas bem compridas, com fogo aceso em lareira, aquele cafezinho aromático, tudo isso eu diria que faz parte mesmo da mineirice que todos conhecemos.

Mas, agora é que mora o X da questão. A mineiridade não aflora em qualquer mineiro, não. Ela é o resultado de toda uma trajetória de quem curtiu com sabedoria todos os estágios de sua mineirice. E, quando ela chega, sai debaixo! Não tem para ninguém! O mineiro em estágio de mineiridade é algo que não se define. Ele tem a simplicidade do matuto, mas a sabedoria de um mestre. Ele é comedido, moderado, não tem pressa, mas chega aonde precisa; tem cautela; escuta mais do que fala e só fala quando já tirou as conclusões em sua mente; escreve como ninguém; faz poesia, tanto em prosa quanto em verso; sabe guardar seu dinheiro e banco nenhum, até hoje, conseguiu reunir em cartilha o alfabeto de sua poupança. É arredio a cartões de crédito, gosta de experimentar o computador, mas prefere suas anotações de pé de página. Seus diálogos com os filhos tem sabedoria e suas famílias são bem entrosadas. Sabe se dar ao prazer de uma boa mesa, através da culinária, mas entende a fundo de sua indústria de queijos.

A mineirice, quando evolui, vira um modus-vivendi (maneira de viver) capaz de filtrar as essências, separar o bem do mal, aprimorar, divertir sem arreganhar, comer sem fartar, trabalhar para colher seu pão e os próprios frutos, amar sem se promiscuir. Se o mineiro em mineiridade conseguir ganhar dinheiro, ele tem os pés no chão, não vai à lua achando que é queijo da fazenda; consegue viver com parcimônia e separar o necessário, para jogar o supérfluo na poupança; não se interessa no prazer do momento, mas em prolongar seus momentos de prazer vida afora; não troca seus amigos por conhecidos e não escuta mais os vendedores de bondes que o seduziam em sua extinta mineirice.

Vale a pena se enveredar pela alma em MINEIRIDADE. Pena que poucos são os mineiros que a atingem e os que chegaram a essa felicidade têm, de fato, um prazer enorme de cultuar tudo o que é bom, a essência de cada detalhe. Mas como explicar isso aí para quem não é mineiro ou para os mineiros que não atingiram este invejável dom da MINEIRIDADE?